
Considere a figura acima e tente responder: para um investidor não especialista, qual desses gráficos é mais ilusório? Mais especificamente, qual dos gráficos levariam o investidor a ter uma postura menos preocupada em relação aos riscos desse investimento?
Imagine que você viaja uma vez por ano, de carro, com sua família. Seu plano é sair alí de Fortaleza, pegar a rodovia Santos Dummont e “descer” até o extremo sul do estado do Ceará, alí pelas bandas da Serra do Araripe, lugar maravilhoso. Você calibrou os pneus, fez a revisão do veículo, abasteceu o tanque e atualizou o GPS. Montou também sua playlist de viagem naquele aplicativo de streaming que você adora. Tudo certo, a família entra no carro logo cedo e a BR-116 está aquele tapete de veludo. Você pisa fundo e segue viagem. Já percorreu mais da metade da viagem e tudo bem, a rodovia é realmente uma maravilha. Todavia, lá no km 376, chegando próximo de Icó, você é surpreendido. Como você é um pessoa com perfil de risco agressivo, apesar das sinalizações, você vai a 130 km/h, feliz porque vai chegar cedo e porque a pista é irretocável. Entretanto, alí, naquela parte da rodovia, há um trecho com uma “cratera” que vai de um lado ao outro da pista, abriu ontem, por causa da chuva e você não sabia.
Mas e se a BR-116 não estivesse em tão perfeita ordem? Aqui e ali, ainda que raramente, você passaria por alguns buracos, alguns deles com tamanho e profundidade suficientes para quebrar o carro? Você iria a 130 km/k? Sabendo que aqui e ali brotam buraquinhos na estrada? Talvez você ficasse mais alerta, tomaria mais cuidado e não andaria tão rápido. A cratera ainda estaria lá, mas você estaria em melhor condição de fazer algo a respeito. De uma forma menos prosaica, esses gráficos ilustram essa ideia.
A contingência se refere a eventos que podem ou não acontecer. Quando estamos totalmente cegos para a contingência, estamos, basicamente, imersos em incerteza. Outras vezes podemos aquilatar a contingência, mensurá-la, ponderá-la e estimar suas probabilidades. Nesse cenário, quando ponderamos a contingência, estamos medindo o risco. A percepção de que a contingência é elemento sempre presente na condição humana nos fez procurar meios de estimá-la, de medir seus impactos e de nos proteger das causalidades. Em um cenário em que nada de inesperado acontece, não há razão para medir riscos e fazer previsões. Nesse sentido, uma situação como a figura em azul se constitui uma armadilha perigosa para um investidor.
No mercado de capitais, muitas vezes, essas lições são duramente aprendidas. Para um sujeito que ignora a contingência e toma por certo a suavidade de seus retornos, a lição que precisa ser compreendida, qual seja, a contingência sempre está a espreita e precisa ser, se não domada, mas pelo menos analisada e esperada a qualquer tempo, pode custar uma pequena fortuna.
A metáfora da rodovia nos faz refletir sobre duas lições importantíssimas: a primeira é que não há garantias de que o caminho será suave e seguro o tempo todo, em algum momento, a contingência nos faz uma visita e tanto melhor se estivermos esperando por ela. A segunda lição é que em muitas situações podemos mensurar riscos a partir dos sinais que a contingência nos dá. Traduzindo nossa metáfora para o mercado de capitais, vemos que por mais que o histórico de retornos de um investimento seja impecável, raramente é, há sempre riscos à espreita. Além disso, os sinais de riscos podem ser um forte aliado para o investidor, nos mostrando que o potencial para que uma situação desfavorável aconteça costuma ser sinalizado com alguma antecedência.